Wendy
uma bolinha de pelo preto do tamanho da minha mão
A Wendy foi o meu primeiro cão e também a minha grande mestre. Conheci-a com pouco mais de um mês, uma bolinha de pelo preto do tamanho da minha mão, e desde esse dia fomos fiéis companheiras durante dois anos e meio, na alegria e na doença, na cozinha ou no quintal, na praia ou na noite escura…
A primeira grande lição que a Wendy me tentou ensinar, e que eu vou aprendendo, é que o amor se dá sem esperar receber em troca e dá-se mesmo que o destinatário não o mereça, e eu não merecia quando descarregava na Wendy as minhas dores e frustrações….
A segunda maior lição de todas, foi a paciência. A Wendy adoeceu pela primeira vez pouco depois de celebrar um ano de idade, tendo passado por vários médicos, exames, internamentos, mas sem ninguém descobrir a doença que tinha nem a forma de a curar. Um desgosto de morte para mim, morte lenta posso dizer, visível nos últimos passeios que fizemos juntas pelas ruas de Algés, com ela ao meu colo, perante o olhar incrédulo de vizinhos, porque a Wendy já não andava mas não desistíamos de tentar distrair-nos do sofrimento. Por coincidência, ou não, também eu atravessava um período difícil de vida, que terminou com a perda de uma grande amiga e o fim de um divórcio, parecendo que na minha vida e na da Wendy tudo balançava entre o fim ou o começar de novo.
A terceira maior lição, foi a aceitação. A Wendy adoeceu quando fez um ano, esteve às portas da morte mas eu nunca desisti e, contra tudo e contra todos, arranquei-a do hospital e trouxe-a para casa, para morrer junto a mim. A medicina não explica, e eu acredito que foi o amor que recuperou a Wendy por mais um ano, precisamente o tempo que eu precisei para me organizar e começar de novo. A Wendy ainda viveu feliz e ainda conheceu a minha casa nova, onde juntas olhámos o Tejo e onde veio a morrer uma semana depois, pouco depois de a arrancar mais uma vez do hospital porque ia morrer nas horas seguintes. Por mais que eu resistisse, por mais que eu acreditasse na força do amor, à segunda foi de vez e aprendi (ou vou aprendendo) que na vida não há mau nem bom, mas apenas o que se aceita ou se resiste. Acabei por aceitar a partida da Wendy, não tive outro remédio, e ainda hoje me custa, mas eu sei que não a vejo, não lhe toco nem sinto, mas a Wendy está dentro de mim, das minhas memórias e pensamentos porque se hoje sou quem sou, muito à Wendy eu devo.
Como costumo dizer à minha filha, quando lhe batem as tristezas/saudades: “Eu sei que a morte da Wendy é uma imeeeeensa perda, mas lembra-te que só é imensa porque imeeeeeensa foi também a presença dela nas nossas vidas. Celebra miúda, somos umas sortudas”.
Bem hajas Wendy, no meu coração não há ferida que o teu amor não sare.
Bem hajas Inês, porque sou inteiramente grata por todos os segundos que me acompanhaste neste caminho,
Bem hajas Wanda, por seres uma sortuda com as tuas amigas.
WANDA
* Esta é uma história contada na primeira pessoa. A sessão fotográfica da Wendy, Grande Mestre e Amiga, foi feito num jardim em Lisboa.